Melhores poemas de Jorge de Lima

Além de poeta, Jorge de Lima (1893–1953) foi romancista, ensaísta, tradutor e político brasileiro, considerado um dos grandes nomes da literatura modernista. Nascido em União dos Palmares, Alagoas, formou-se em Medicina no Rio de Janeiro, mas sua verdadeira paixão sempre foi a literatura.

Também atuou como docente e diretor na Escola Normal Estadual de Maceió. Adicionalmente, ocupou os cargos de Diretor-Geral da Instrução Pública e Saúde, além de ser deputado estadual. O casal se transferiu para o Rio de Janeiro em 1930, onde o médico e escritor estabeleceu um consultório. Foi docente de literatura brasileira na Universidade do Brasil, nessa cidade.

Durante essa década, o poeta ocupou o cargo de vereador no Rio de Janeiro; tentou sem sucesso entrar para a Academia Brasileira de Letras; e retornou ao catolicismo, que havia deixado de lado na sua juventude. Durante os anos em que esteve doente, sua fé se intensificou, culminando em sua morte em 15 de novembro de 1953, no Rio de Janeiro.

 

            Obras do autor:

 

Poesia:

XIV alexandrinos (1914);

Poemas (1927);

Novos poemas (1929);

Poemas escolhidos (1932);

A túnica inconsútil (1938);

Anunciação e encontro de Mira-Celi (1943);

Poemas negros (1947);

Livro de sonetos (1949);

Vinte sonetos (1949);

Invenção de Orfeu (1952);

Castro Alves. Vidinha (1952);

 

            Romance:

Salomão e as mulheres (1927);

O anjo (1934);

Calunga (1935);

A mulher obscura (1939);

Guerra dentro do beco (1950).

 

Ensaios e Traduções:

Ladrão de Purezas (1944) – Reflexões filosóficas e literárias.

Tradução da Divina Comédia, de Dante Alighieri.

 

Eis os poemas que destaco como melhores desse autor:

 

  1. A divisão de Cristo

Dividamos o mundo em duas partes iguais:
uma para portugueses, outra para espanhóis.
Vêm quinhentos mil escravos no bojo das naus:
a metade morreu na viagem do oceano.

 

Dividamos o mundo entre as pátrias.
Vêm quinhentos mil escravos no bojo das guerras:
a metade morreu nos campos de batalha.

 

Dividamos o mundo entra as máquinas.
Vêm quinhentos mil escravos no bojo das fábricas:
a metade morreu na escuridão, sem ar.

 

Não dividamos o mundo.
Dividamos Cristo:
todos ressuscitarão iguais.

 

  1. Velho Tema, a Saudade

 

Quem não a canta? Quem? Quem não a canta e sente?
Chama que já passou mas que assim mesmo é chama…
A Saudade, eu a sinto infinda, confidente.
Que de longe me acena e me fascina e chama…

 

Mágoa de todo o mundo e que tem toda gente:
Uns sorrisos de mãe… uns sorrisos de dama…
Um segredo de amor que se desfaz e mente…
Quem não os teve? Quem? Quem não os teve e os ama?

 

Olhos postos ao léu, altívagos, à toa,
Quantas vezes tu mesmo, a cismar, de repente
Te ficaste gozando uma saudade boa?

 

Se vês que em teu passado uma saudade adeja,
-Faze que uma saudade a ti seja o presente!
-Faze que tua morte uma saudade seja!

 

  1. Minha sombra

De manhã a minha sombra

com meu papagaio e o meu macaco

começam a me arremedar.

E quando eu saio

a minha sombra vai comigo

fazendo o que eu faço

seguindo os meus passos.

 

Depois é meio-dia.

E a minha sombra fica do tamaninho

de quando eu era menino.

Depois é tardinha.

E a minha sombra tão comprida

brinca de pernas de pau.

 

Minha sombra, eu só queria ter

o humor que você tem,

ter a sua meninice,

ser igualzinho a você.

 

E de noite quando escrevo,

fazer como você faz,

como eu fazia em criança:

Minha sombra você põe a sua mão

por baixo da minha mão,

vai cobrindo o rascunho dos meus poemas

sem saber ler e escrever.

 

  1. Mulher Proletária

Mulher proletária — única fábrica
que o operário tem, (fábrica de filhos)
tu
na tua superprodução de máquina humana
forneces anjos para o Senhor Jesus,
forneces braços para o senhor burguês.

 

Mulher proletária,
o operário, teu proprietário
há de ver, há de ver:
a tua produção,
a tua superprodução,
ao contrário das máquinas burguesas
salvar teu proprietário.

 

  1. O acendedor de lampiões

Lá vem o acendedor de lampiões de rua!

Este mesmo que vem, infatigavelmente,

Parodiar o Sol e associar-se à lua

Quando a sobra da noite enegrece o poente.

 

Um, dois, três lampiões, acende e continua

Outros mais a acender imperturbavelmente,

À medida que a noite, aos poucos, se acentua

E a palidez da lua apenas se pressente.

 

Triste ironia atroz que o senso humano irrita:

Ele, que doira a noite e ilumina a cidade,

Talvez não tenha luz na choupana em que habita.

 

Tanta gente também nos outros insinua

Crenças, religiões, amor, felicidade

Como este acendedor de lampiões de rua!

 

  1. Distribuição da Poesia

 

Mel silvestre tirei das plantas,
sal tirei das águas, luz tirei do céu.
Escutai, meus irmãos: poesia tirei de tudo
para oferecer ao Senhor.
Não tirei ouro da terra
nem sangue de meus irmãos.
Estalajadeiros não me incomodeis.
Bufarinheiros e banqueiros
sei fabricar distâncias
para vos recuar.
A vida está malograda,
creio nas mágicas de Deus.
Os galos não cantam,
a manhã não raiou.
Vi os navios irem e voltarem.
Vi os infelizes irem e voltarem.
Vi homens obesos dentro do fogo.
Vi ziguezagues na escuridão.
Capitão-mor, onde é o Congo?
Onde é a Ilha de São Brandão?
Capitão-mor que noite escura!
Uivam molossos na escuridão.
Ó indesejáveis, qual o país,
qual o país que desejais?
Mel silvestre tirei das plantas,
sal tirei das águas, luz tirei do céu.
Só tenho poesia para vos dar.
Abancai-vos, meus irmãos.

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