Poemas para o PAS-UnB 1º Etapa Parte 2

Aqui estão 8 dos poemas exigidos pela UnB para o Pas 1º Etapa. No primeiro post já colocamos 6 dos poemas. Eis aqui os poemas restantes e seus respectivos autores: Ao desconcerto do mundo de Luís de Camões; A Jesus Cristo Nosso Senhor de Gregório de Matos; Envolver-se na confusão dos néscios para passar melhor a vida de Gregório de Matos; O poeta descreve a Bahia de Gregório de Matos; Declara-se temendo perder por ousado de Gregório de Matos; Torno a ver-vos, ó montes; o destino de Cláudio Manoel da Costa; Leia a posteridade, ó pátrio Rio de Cláudio Manoel da Costa e Caso pluvioso de Carlos Drummond de Andrade.

Boa leitura!

 

1. Ao desconcerto do mundo – Luís de Camões

Os bons vi sempre passar

No mundo graves tormentos;

E, para mais me espantar,

Os maus vi sempre nadar

Em mar de contentamentos.

 

Cuidando alcançar assim

O bem tão mal ordenado,

Fui mau, mas fui castigado:

Assim que, só para mim,

Anda o mundo concertado.

 

2. A Jesus Cristo Nosso Senhor – Gregório de Matos

 Pequei, Senhor; mas não porque hei pecado,

Da vossa alta clemência me despido;

Antes, quanto mais tenho delinquido,

Vos tenho a perdoar mais empenhado.

 

Se basta a vos irar tanto pecado,

A abrandar-vos sobeja um só gemido:

Que a mesma culpa, que vos há ofendido,

Vos tem para o perdão lisonjeado.

 

Se uma ovelha perdida já cobrada,

Glória tal e prazer tão repentino

Vos deu, como afirmais na Sacra História:

 

Eu sou, Senhor, a ovelha desgarrada,

Cobrai-a; e não queirais, Pastor Divino,

Perder na vossa ovelha a vossa glória.

 

3. Envolver-se na confusão dos néscios para passar melhor a vida – Gregório de Matos

Carregado de mim ando no mundo,

E o grande peso embarga-me as passadas,

Que como ando por vias desusadas,

Faço o peso crescer, e vou-me ao fundo.

 

O remédio será seguir o imundo

Caminho, onde dos mais vejo as pisadas,

Que as bestas andam juntas mais ousadas,

Do que anda só o engenho mais profundo.

 

Não é fácil viver entre os insanos,

Erra, quem presumir que sabe tudo,

Se o atalho não soube dos seus danos.

 

O prudente varão há de ser mudo,

Que é melhor neste mundo, mar de enganos,

Ser louco c’os demais que só, sisudo.

 

4. O poeta descreve a Bahia – Gregório de Matos

A cada canto um grande conselheiro,

Que nos quer governar cabana e vinha;

Não sabem governar sua cozinha

E podem governar o mundo inteiro.

 

Em cada porta um bem frequente olheiro,

Que a vida do vizinho e da vizinha

Pesquisa, escuta, espreita e esquadrinha,

Para o levar à praça e ao terreiro.

 

Muitos mulatos desavergonhados,

Trazidos sob os pés os homens nobres,

Posta nas palmas toda a picardia.

 

Estupendas usuras nos mercados,

Todos os que não furtam muito pobres:

E eis aqui a cidade da Bahia.

 

5. Declara-se temendo perder por ousado – Gregório de Matos

Anjo no nome, Angélica na cara,
Isso é ser flor, e Anjo juntamente,
Ser Angélica flor, e Anjo florente,
Em quem, senão em vós se uniformara?

Quem veria uma flor, que não a cortara
De verde pé, de rama florescente?
E quem um Anjo vira tão luzente,
Que por seu Deus, o não idolatra?

Se como Anjo sois dos meus altares,
Fôreis o meu custódio, e minha guarda,
Livrara eu de diabólicos azares.

Mas vejo, que tão bela, e tão galharda,
Posto que os Anjos nunca dão pesares,
Sois Anjo, que me tenta, e não me guarda.

 

6. Torno a ver-vos, ó montes; o destino – Cláudio Manoel da Costa

 Torno a ver-vos, ó montes; o destino

Aqui me torna a pôr nestes oiteiros;

Onde um tempo os gabões deixei grosseiros

Pelo traje da Côrte rico, e fino.

 

Aqui estou entre Almendro, entre Corino,

Os meus fiéis, meus doces companheiros,

Vendo correr os míseros vaqueiros

Atrás de seu cansado desatino.

 

Se o bem desta choupana pode tanto,

Que chega a ter mais preço, e mais valia,

Que da cidade o lisonjeiro encanto;

 

Aqui descanse a louca fantasia;

E o que até agora se tornava em pranto,

Se converta em afetos de alegria.

 

7. Leia a posteridade, ó pátrio Rio – Cláudio Manoel da Costa

 Leia a posteridade, ó pátrio Rio,

Em meus versos teu nome celebrado,

Por que vejas uma hora despertado

O sono vil do esquecimento frio:

 

Não vês nas tuas margens o sombrio,

Fresco assento de um álamo copado;

Não vês ninfa cantar, pastar o gado

Na tarde clara do calmoso estio.

 

Turvo banhando as pálidas areias

Nas porções do riquíssimo tesouro

O vasto campo da ambição recreias.

 

Que de seus raios o planeta louro

Enriquecendo o influxo em tuas veias,

Quanto em chamas fecunda, brota em ouro.

 

8. Caso pluvioso – Carlos Drummond de Andrade

A chuva me irritava. Até que um dia

descobri que Maria é que chovia.

A chuva era Maria. E cada pingo de

Maria ensopava o meu domingo.

 

E meus ossos molhando, me deixava

como terra que a chuva lavra e lava.

Eu era todo barro, sem verdura…

Maria, chuvosíssima criatura!

 

Ela chovia em mim, em cada gesto,

pensamento, desejo, sono, e o resto.

Era chuva fininha e chuva grossa,

matinal e noturna, ativa…Nossa!

 

Não me chovas, Maria, mais que o justo

chuvisco de um momento, apenas susto.

Não me inundes de teu líquido plasma,

não sejas tão aquático fantasma!

 

Eu lhe dizia em vão – pois que Maria

quanto mais eu rogava, mais chovia.

E chuveirando atroz em meu caminho,

o deixava banhado em triste vinho,

 

que não aquece, pois água de chuva

mosto é de cinza, não de boa uva.

Chuvadeira Maria, chuvadonha,

chuvinhenta, chuvil, pluvimedonha!

 

Eu lhe gritava: Para! e ela chovendo,

Poças d’água gelada ia tecendo.

E choveu tanto Maria em minha casa

que a correnteza forte criou asa

 

E um rio se formou, ou mar, não sei,

sei apenas que nele me afundei.

E quanto mais as ondas me levavam,

as fontes de Maria mais chuvavam,

 

de sorte que com pouco, e sem recurso,

as coisas se lançaram no seu curso,

e eis o mundo molhado e sovertido

sob aquele sinistro e atro chuvido.

 

Os seres mais estranhos se juntando

na mesma aquosa pasta iam clamando

contra essa chuva estúpida e mortal

catarata (jamais houve outra igual).

 

Anti-petendam cânticos se ouviram.

Que nada! As cordas d’água mais deliram,

e Maria, torneira desatada,

mais se dilata em sua chuvarada.

 

Os navios soçobram. Continentes

já submergem com todos os viventes,

e Maria chovendo. Eis que a essa altura,

delida e fluida a humana enfibratura,

 

e a terra não sofrendo tal chuvência,

comoveu-se a Divina Providência,

e Deus, piedoso e enérgico, bradou:

Não chove mais, Maria! – e ela parou.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Rolar para cima