Poemas para o PAS-UnB 2º Etapa – Parte 1

Aqui estão 6 dos poemas exigidos pela UnB para o Pas 2º Etapa.

 

1. Mal secreto – Raimundo Correia

Se a cólera que espuma, a dor que mora

Na alma, e destrói cada ilusão que nasce,

Tudo o que punge, tudo o que devora

O coração, no rosto se estampasse;

 

Se se pudesse o espírito que chora

Ver através da máscara da face,

Quanta gente, talvez, que inveja agora

Nos causa, então piedade nos causasse

 

Quanta gente que ri, talvez, consigo

Guarda um atroz, recôndito inimigo,

Como invisível chaga cancerosa!

 

Quanta gente que ri, talvez existe,

Cuja a ventura única consiste

Em parecer aos outros venturosa!

 

2. Ismália – Alphonsus de Guimaraens

Quando Ismália enlouqueceu,

Pôs-se na torre a sonhar…

Viu uma lua no céu,

Viu outra lua no mar.

 

No sonho em que se perdeu,

Banhou-se toda em luar…

Queria subir ao céu,

Queria descer ao mar…

 

E, no desvario seu,

Na torre pôs-se a cantar…

Estava perto do céu,

Estava longe do mar…

 

E como um anjo pendeu

As asas para voar…

Queria a lua do céu,

Queria a lua do mar…

 

As asas que Deus lhe deu

Ruflaram de par em par…

Sua alma subiu ao céu,

Seu corpo desceu ao mar…

 

3. Lembrança de Morrer – Álvares de Azevedo

No more! o never more! – SHELLEY.

Quando em meu peito rebentar-se a fibra
Que o espírito enlaça à dor vivente,
Não derramem por mim nem uma lágrima
Em pálpebra demente.

E nem desfolhem na matéria impura
A flor do vale que adormece ao vento:
Não quero que uma nota de alegria
Se cale por meu triste passamento.

Eu deixo a vida como deixa o tédio
Do deserto, o poento caminheiro
— Como as horas de um longo pesadelo
Que se desfaz ao dobre de um sineiro;

Como o desterro de minh’alma errante,
Onde fogo insensato a consumia:
Só levo uma saudade — é desses tempos
Que amorosa ilusão embelecia.

Só levo uma saudade — é dessas sombras
Que eu sentia velar nas noites minhas…
De ti, ó minha mãe, pobre coitada
Que por minha tristeza te definhas!

De meu pai… de meus únicos amigos,
Poucos — bem poucos — e que não zombavam
Quando, em noite de febre endoudecido,
Minhas pálidas crenças duvidavam.

Se uma lágrima as pálpebras me inunda,
Se um suspiro nos seios treme ainda
É pela virgem que sonhei… que nunca
Aos lábios me encostou a face linda!

Só tu à mocidade sonhadora
Do pálido poeta deste flores…
Se viveu, foi por ti! e de esperança
De na vida gozar de teus amores.

Beijarei a verdade santa e nua,
Verei cristalizar-se o sonho amigo….
Ó minha virgem dos errantes sonhos,
Filha do céu, eu vou amar contigo!

Descansem o meu leito solitário
Na floresta dos homens esquecida,
À sombra de uma cruz, e escrevam nelas
— Foi poeta — sonhou — e amou na vida.—

Sombras do vale, noites da montanha
Que minh’alma cantou e amava tanto,
Protegei o meu corpo abandonado,
E no silêncio derramai-lhe canto!

Mas quando preludia ave d’aurora
E quando à meia-noite o céu repousa,
Arvoredos do bosque, abri os ramos…
Deixai a lua prantear-me a lousa!

 

4. Profissão de Fé – Olavo Bilac

Le poete est ciseleur,
Le ciseleur est poete.
VICTOR HUGO

Não quero o Zeus Capitolino,
Hercúleo e belo,
Talhar no mármore divino
Com o camartelo.
(…)
Invejo o ourives quando escrevo:
Imito o amor
Com que ele, em ouro, o alto relevo
Faz de uma flor.
(…)
Quero que a estrofe cristalina,
Dobrada ao jeito
Do ourives, saia da oficina
Sem um defeito:
(…)
Porque o escrever — tanta perícia,
Tanta requer,
Que ofício tal… nem há notícia
De outro qualquer.

Assim procedo. Minha pena
Segue esta norma,
Por te servir, Deusa serena,
Serena Forma!

Deusa! A onda vil, que se avoluma
De um torvo mar,
Deixa-a crescer; e o lodo e a espuma
Deixa-a rolar!
(…)
Não morrerás, Deusa sublime!
Do trono egrégio
Assistirás intacta ao crime
Do sacrilégio.

E, se morreres porventura,
Possa eu morrer
Contigo, e a mesma noite escura
Nos envolver!
(…)
Vive! que eu viverei servindo
Teu culto, e, obscuro,
Tuas custódias esculpindo
No ouro mais puro.

Celebrarei o teu ofício
No altar: porém,
Se inda é pequeno o sacrifício,
Morra eu também!

Caia eu também, sem esperança,
Porém tranquilo,
Inda, ao cair, vibrando a lança,
Em prol do Estilo!

 

5. O assinalado – Cruz e Sousa

Tu és o louco da imortal loucura,
O louco da loucura mais suprema.
A Terra é sempre a tua negra algema,
Prende-te nela a extrema Desventura.

Mas essa mesma algema de amargura,
Mas essa mesma Desventura extrema
Faz que tu’alma suplicando gema
E rebente em estrelas de ternura.

Tu és o Poeta, o grande Assinalado
Que povoas o mundo despovoado,
De belezas eternas, pouca a pouco…

Na Natureza prodigiosa e rica
Toda a audácia dos nervos justifica
Os teus espasmos imortais de louco!

 

6. A canção do africano – Castro Alves
Lá na úmida senzala,
Sentado na estreita sala,
Junto ao braseiro, no chão,
Entoa o escravo o seu canto,
E ao cantar correm-lhe em pranto
Saudades do seu torrão…

De um lado, uma negra escrava
Os olhos no filho crava,
Que tem no colo a embalar…
E à meia voz lá responde
Ao canto, e o filhinho esconde,
Talvez pra não o escutar!

“Minha terra é lá bem longe,
Das bandas de onde o sol vem;
Esta terra é mais bonita,
Mas à outra eu quero bem!

“O sol faz lá tudo em fogo,
Faz em brasa toda a areia;
Ninguém sabe como é belo
Ver de tarde a papa-ceia!

“Aquelas terras tão grandes,
Tão compridas como o mar,
Com suas poucas palmeiras
Dão vontade de pensar …

“Lá todos vivem felizes,
Todos dançam no terreiro;
A gente lá não se vende
Como aqui, só por dinheiro”.

O escravo calou a fala,
Porque na úmida sala
O fogo estava a apagar;
E a escrava acabou seu canto,
Pra não acordar com o pranto
O seu filhinho a sonhar!
……………………….
O escravo então foi deitar-se,
Pois tinha de levantar-se
Bem antes do sol nascer,
E se tardasse, coitado,
Teria de ser surrado,
Pois bastava escravo ser.

E a cativa desgraçada
Deita seu filho, calada,
E põe-se triste a beijá-lo,
Talvez temendo que o dono
Não viesse, em meio do sono,
De seus braços arrancá-lo!

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